Escrever é arte de cortar palavras.
Por Arnaldo Nogueira
O homem chega à feira e lá encontra seu compadre, arrumando os peixes num imenso tabuleiro de madeira. Cumprimentam- se. O feirante está contente com o sucesso do seu modesto comércio. Entrou no negócio há poucos meses e já pôde até comprar um quadro-negro pra badalar seu produto.
Atrás do balcão, num quadro-negro, está a mensagem, escrita a giz, em letras caprichadas: HOJE VENDO PEIXE FRESCO. Pergunta, então, ao amigo e compadre:
- Você acrescentaria mais alguma coisa?
O compadre releu o anúncio. Discreto, elogiou a caligrafia. Como o outro insistisse, resolveu questionar. Perguntou ao feirante :
- Você já notou que todo o dia é sempre hoje? - E acrescentou: - Acho dispensável. Esta palavra está sobrando...
O feirante aceitou a ponderação: apagou o advérbio. O anúncio ficou mais enxuto. VENDO PEIXE FRESCO.
- Se o amigo me permite - tornou o visitante -, gostaria de saber se aqui nessa feira existe alguém dando peixe de graça. Que eu saiba, estamos numa feira. E feira é sinônimo de venda. Acho desnecessário o verbo. Se a banca fosse minha, sinceramente, eu apagaria o verbo.
O anúncio encurtou mais ainda: PEIXE FRESCO.